Senna estava a 11 voltas de um novo triunfo em Monte Carlo quando bateu sozinho no guard rail e deixou a vitória de bandeja para Prost.
O Campeonato Mundial de Fórmula 1 de 1988 estava somente na terceira das 16 etapas. Mas, para as equipes que ainda sonhavam em disputar o título com a McLaren, aquele Grande Prêmio de Mônaco já tinha ares de decisão. Seu traçado sinuoso e de baixa velocidade oferecia, na teoria, a primeira chance de vitória aos carros de motor aspirado, como Williams e Benetton, bem como aos turbinados de Ferrari e Lotus que até então vinham comendo poeira de Alain Prost e Ayrton Senna. Na prática, porém, caso as McLaren repetissem nas ruas do principado os passeios dados nas duas provas anteriores, aí era hora de jogar a toalha e já pensar em 1989.
Com a velocidade média deixando a casa dos quase 200 km/h e despencando para cerca de 130 km/h, os cavalos dos motores Honda não ofereceriam tanta vantagem.
O talento do piloto para dirigir na pista estreita e a aerodinâmica dos carros poderiam ser fatores mais importantes. O problema, claro, é que, além de seus dois condutores fora de série, os chassis da McLaren pareciam estar anos luz á frente do restante.
Ayrton Senna, antes do começo dos treinos, reconhecia que aquela corrida seria um divisor de águas para sua escuderia e, por consequência, também para as demais. Vai ser o teste final do carro: se ele mostrar que é superior também em circuitos lentos, vai ficar muito difícil para as outras equipes alcançarem a McLaren.
SÓ DEU SENNA
A McLaren predominou nos treinos de quinta e sábado, como esperado. Mas o que mais chamou a atenção dos espectadores foi a vantagem obtida por Senna em relação a Prost. Na primeira sessão oficial, o brasileiro ficou nada menos que 2 segundos á frente do francês, com tempos respectivamente de 1m26s464 e 1m28s375. Na tomada de tempo decisiva, a diferença foi menor: 1m23s998 para Senna e 1m25s425 para Prost. Ainda assim, o 1,5 segundo que separava os companheiros de equipe era, em termos de Fórmula 1, abissal. Gerhard Berger e Michele Alboreto, da Ferrari, compunham a segunda fila, seguidos por Nigel Mansell, da Williams, e Alessandro Nannini, da Benetton.
Ao fazer sua terceira pole em três corridas, Senna inegavelmente colocou pressão em Prost. O francês, com expressão preocupada, justificou o mau desempenho com um combo de desculpas que incluía tráfego, problema de freios e até uma suposta menor potência do motor que Honda havia preparado para os circuitos lentos.
Senna, por sua vez, estava confiante. Até porque sair na ponta em Monte Carlo significava meio caminho andado para a vitória. Sem dúvida, Mônaco é a pista mais importante da temporada para você largar na frente. Os riscos de acidente são menores e você tem pista livre para fazer seu próprio ritmo de corrida, fazer o seu jogo. Quem vem atrás tem um trabalho gigantesco e se desgasta muito mais, pois os pontos de ultrapassagem praticamente não existem.
INACREDITÁVEL
Tudo – ou quase tudo – o que Senna previa aconteceu. Quando a luz verde se acendeu, Ayrton disparou na frente, passando pela primeira curva, a temida Sainte Devote, ileso e sem ser incomodado. Prost, por sua vez, bobeou na largada e perdeu a posição para Berger, em uma configuração que favorecia ainda mais o líder da prova: enquanto o brasileiro só teria o trabalho de acelerar, a McLaren do francês encararia um árduo duelo pela segunda posição com a Ferrari do austríaco. E põe árduo nisso. Foram necessárias 54 voltas até que Prost finalmente ultrapassasse Berger. A essa altura, Ayrton Senna já estava a inalcançáveis 48 segundos de distância do segundo colocado. Faltavam 24 voltas para o final. Estava muito fácil. Fácil até demais.
A 11 voltas da bandeirada, no que classificaria mais tarde como um estúpido erro, Senna desconcentrou-se e bateu no guard rail do lado direito, na entrada da curva que levava ao túnel. O carro atravessou a pista e chocou-se com o muro do lado oposto, danificando o bico e a suspensão dianteira. Senna perdia uma corrida ganha. Prost ganhava uma corrida perdida.
EXPERIÊNCIA DO PROFESSOR
Com a vitória, Prost disparou na tabela de classificação do campeonato: 24 pontos, contra 14 de Berger e 9 de Senna. É muito cedo para relaxar. Em circuitos como Detroit e Montreal, Senna continua tendo tudo para vencer. Afinal, o campeonato está apenas começando, afirmou, diplomático, depois da corrida. Para a imprensa francesa, porém, foi mais sincero, dizendo que o triunfo só aconteceu porque decidiu não entrar no jogo de Ayrton, sem se forçar para acompanhar a velocidade do companheiro de equipe. Não tenho mais motivação para correr riscos inúteis. Prefiro usar minhas próprias armas, minha experiência.