Chuva torrencial causou confusão generalizada e fez última prova da temporada ser interrompida logo no início.
Assim como nos quatro anos anteriores, em 1991 o circo da Fórmula 1 desembarcou na Austrália, palco da última etapa da temporada, com o título mundial de pilotos já decidido – mais uma vez, em favor do agora tricampeão Ayrton Senna. Mas, ao menos no box da McLaren, a prova estava longe de ser encarada como um passeio de férias. Em primeiro lugar, porque ainda seguia em jogo o campeonato mundial de construtores, com a equipe de Ron Dennis buscando confirmar a liderança para manter sua hegemonia entre as equipes: seria o sétimo título da McLaren nos últimos oito anos. E, em segundo lugar, porque Ayrton Senna buscava encerrar um jejum pessoal em Adelaide: Apesar de ter feito quatro poles por lá (1985, 1988, 1989 e 1990), o brasileiro jamais havia vencido a prova.
Por tudo isso, a McLaren resistiu á tentação de mandar á pista sua novíssima suspensão ativa, o que teria sido um teste ideal em condições de prova visando a temporada seguinte. Não tenho a menor dúvida de que a suspensão ativa, quando for colocada no carro, certamente vai ser muito competitiva, mas ainda é um pouco prematuro lançá-la aqui na Austrália.
A caixa de marchas semiautomática foi muito testada, mas continua a ser um risco, afirmou Ron Dennis, sem querer dar a menor brecha para uma possível ultrapassagem da Williams no campeonato de construtores na última corrida do ano. Não adianta enganar ninguém: na Fórmula 1, chegar em segundo é falhar. Simplesmente isso, resumiu.
Além da primeira vitória em Adelaide, Senna também buscava outra marca pessoal para coroar a belíssima temporada de 1991: caso assegurasse a ponta no grid de largada, o tricampeão alcançaria sua 60a pole position, ampliando ainda mais o seu assombroso recorde. A ideia que se tem é de que, uma vez tudo decidido, as coisas vão ficar mais tranquilas. Mas há algo dentro da gente que não funciona assim. Logo que sentei no carro, a minha vontade era a de ter tudo perfeito para poder vencer, afirmou Ayrton após o primeiro treino.
DESAFIO PESSOAL
E bota perfeito nisso. Na sexta, Senna já havia registrado o melhor tempo, (1m14s822), á frente de Gerhard Berger (1m14s822). Essa marca não conseguia ser superada por nenhum adversário no último treino de classificação, no sábado – mas Senna, não contente, desafiou-se e tratou de baixar ainda mais o tempo, cravando 1m14s041. Foi assim que conquistou, com folgas, seu recorde de 60 poles.
No domingo, a chuva caía com tanta intensidade que, na prática, inviabilizava a disputa de um Grande Prêmio de Fórmula 1. Apesar do apelo dos pilotos, a direção de prova optou por não retardar a largada, mesmo com as condições impraticáveis. Senna, que já havia falado para Ron Dennis que seria impossível pilotar naquela pista, então fez um acordo com o comissário Roland Bruynseraede. Sei que há muitos interesses em jogo. Vou correr até onde for possível. Quando sentir que a pista não tem condições, vou agitar os braços e, nesse momento, você suspende a corrida, para evitar um desastre.
Dessa forma, a largada foi dada, com Senna disparando na liderança. A chuva apertou ainda mais após o início da prova, e na volta 16 (de um total de 81) começaram os problemas. Primeiro Mansell, então segundo colocado, perdeu o controle da Williams e bateu com violência no muro. Na sequência, Michael Schumacher, da Benetton, e Jean Alesi, da Ferrari, também colidiram forte, rodaram e atingiram Nicola Larini, da Lambo. Instantes depois, foi a vez de Pierluigi Martini, também rodar e se chocar contra o muro. A confusão era generalizada. Senna, então fez o sinal combinado com a direção de prova, que, para alívio geral da nação, cumpriu sua parte: bandeira vermelha e fim de um Grande Prêmio que sequer deveria ter começado.
O resultado oficial contou a posição da corrida ao fim da volta 14 – duas voltas antes da interrupção, como manda o regulamento, pois se presume que as condições até então eram boas. Dessa forma, Senna, Mansell e Berger ficaram com as três primeiras colocações. E esse resultado confirmou o título mundial de construtores para a McLaren, 139 pontos contra 125 da Williams. (O inglês, porém, não esteve presente no pódio: com fortes dores na cabeça após o impacto, havia sido levado diretamente do carro ao hospital.)
Não era o final de prova com que Senna havia sonhado, mas, de qualquer forma, o brasileiro quebrava mais um tabu pessoal. Em outras oportunidades, aqui na Austrália, eu estive para ganhar e aconteceram coisas inesperadas. Em 1989, bati em Brundle, debaixo de chuva. E aquele acidente me serviu muito na vitória de hoje. Ano passado bati no muro quando estava liderando. Acho que todos hão de reconhecer que, sem falta modéstia, se alguém mereceu vencer essa corrida, fui eu.