Dos infortúnios do primeiro treino á consagração da volta olímpica, o brasileiro viveu um fim de semana inesquecível em Spa-Francorchamps.
Depois de três pódios consecutivos – um segundo lugar na Áustria e dois terceiros lugares, na Holanda e na Itália, Ayrton Senna chegava ao Grande Prêmio da Bélgica de 1985 novamente em alta. No início daquela semana, a Lotus havia confirmado oficialmente que o brasileiro receberia o status de primeiro piloto na temporada de 1986, anúncio que, na prática, representava um até logo da equipe inglesa a Elio de Angelis.
Para coroar a boa fase, faltava apenas uma vitória em Spa-Francorchamps. Só que a primeira sessão de treinos foi um balde de água fria no entusiasmo de Ayrton. Quase tudo que podia dar errado, deu. Problemas no câmbio e no motor, que pegou fogo, inutilizaram seu treino livre da manhã – e impediram o reconhecimento da pista de Spa-Francorchamps, onde correria pela primeira vez. Já na sessão de classificação, Senna perdeu muito tempo buscando acertar a regulagem da suspensão; depois, já sob uma chuva torrencial, sofreu uma quebra de motor que o fez entregar os pontos de vez. No final, terminou em 18a colocação, um de seus piores desempenhos na temporada. Não poderia me acontecer uma sexta-feira 13 melhor, ironizou, no relato do Jornal do Brasil de 14 de setembro.
NOVO COMEÇO
Mas o azar da sexta virou sorte no sábado, Para surpresa geral, a Lotus conseguiu solucionar a maioria dos problemas do carro, dando a Ayrton condições de brigar pela pole position. Ela só não veio, de acordo com o exigente piloto, porque ainda faltou um ajuste que permitisse um melhor aproveitamento dos pneus. De qualquer forma, o brasileiro cravou o segundo tempo, atrás apenas da marca de Alain Prost, da McLaren, líder do campeonato e dono do melhor conjunto da temporada, inegavelmente.
ATÉ PARECEU FÁCIL
Foram 40 voltas de um Grande Prêmio da Bélgica irrepreensível. Quando Ayrton Senna recebeu a bandeira quadriculada, Peter Warr e Gérard Ducarouge mal podiam conter o entusiasmo. Magnífico, é só o que posso dizer, afirmou o projetista francês, de acordo com O Globo de 16 de setembro. Uma corrida perfeita, absolutamente perfeita, em condições extremamente difíceis.
Foi magnífica sim, porque, além da mistura de chuva e sol, e da pista ao mesmo tempo veloz e sinuosa de Spa-Francorchamps, o carro de Ayrton teve sérias dificuldades durante a prova. Primeiro, com a pista secando, os pneus novamente criaram problemas, aquecendo-se rapidamente e perdendo um pouco de aderência. Felizmente veio de novo uma garoa e isso deu para esfriá-los. E ainda não foi o fim do sofrimento: pouco depois, o motor começava a cortar na reta. Manejei-o como pude, consegui reanimá-lo, mas cada vez que chegava na reta, o problema voltava, registrou o jornalista Janos Lengyl, de O Globo.
De alguma forma, Senna levou-o até o final. E não se conteve após garantir sua segunda vitória na Fórmula 1: ao invés de seguir as orientações para voltar aos boxes, desviou sua Lotus dos fiscais e deu uma volta olímpica de comemoração, para delírio do público. Aqui na Bélgica, tudo dependia de boa dosagem na chuva e em pista seca, aproveitando ao máximo as duas fases da corrida. Sendo meu carro bom nas curvas, foi lá que procurei obter a maior vantagem, não me preocupando muito com a eficiência nas retas. O equilíbrio foi bom. E tudo sai bem quando a gente ganha.
QUESTÃO DE TEMPO
Em meio as comemorações no box da escuderia inglesa, Ducarouge fez uma afirmação ousada, que acabou repercutida por diversos periódicos do planeta, entre eles o Jornal dos Sports. Caso não tivéssemos tido problemas de motor tantas vezes, o Ayrton seria campeão ainda este ano, garantiu. Mas esse é um título que ele vai conseguir, mais cedo ou mais tarde. Disso, ninguém duvidava.