A fé de Ayrton Senna e a rivalidade com Alain Prost

A rivalidade de Ayrton Senna e Prost

Sua era uma coisa viva, tangível , e não há dúvida de que ele acreditava ter visto Deus na última volta do Grande Prêmio do Japão.

A família explica que ele era sempre espiritual , acreditava em Deus. Tinha uma enorme, mas não estava ligado a nenhuma religião específica. Adorava ler a Bíblia e sublinhar passagens inspiradores. Sempre meditava e orava. Muitas vezes, dizia ter sentido a presença de Deus nos momentos cruciais da sua vida.

Ayrton se dispunha a discutir essas coisas, desde que suas crenças fossem relatadas de maneira apropriada, e não como uma paródia delas. Ele não se constrangia por causa de suas crenças, nem tinha uma postura defensiva; queria apenas explicá-las do seu jeito. Por exemplo, uma vez, ele disse ao jornal esportivo francês Léquipe (em 1989): acho que possuo um tipo de força que me coloca mais perto de Deus. É difícil de explicar, mas é isso que sinto. Tenho sorte de ter encontrado esse caminho para tal estado de harmonia.

Quero aprender e saber tudo o que a pode me proporcionar e fazer as outras pessoas entenderem da mesma forma. Muita gente não consegue encontrar o contentamento porque, no mundo em que vivemos, o que é branco é branco, e o que é preto é preto.

É justo, e necessário, ouvir as reflexões de Alain Prost sobre isso, pois elas abrem caminho para o que aconteceu depois. Prost não concorda que Senna fosse um piloto duro na pista; na verdade, em vez disso, ele tinha as próprias regras. Acreditava nelas e ponto final. Era extremamente religioso e falava sobre dizer a verdade, sobre sua educação, sua criação e tudo o mais. Na época, eu achava que algumas coisas que Ayrton fazia na pista não combinava com o que dizia, mas, agora, me parece que algumas vezes ele estava errado. Senna tinha aquelas regras, era regido por elas e não se interessava por mais nada. Pensando hoje, acho realmente que ele acreditava mesmo que estava sempre certo, sempre dizendo a verdade – e, na pista, era exatamente igual.

O relacionamento com Prost não sobreviveu a segunda temporada na McLaren. De fato, implodiu já na segunda corrida, em circunstâncias curiosas. Os dois pilotos achavam que se arriscariam a perder corridas se tirassem um ao outro da competição. Por isso, concordaram não ultrapassar um ao outro da largada até a frenagem da primeira curva do Grande Prêmio de San Marino. Uma vez que tivessem passado essa distância com segurança, então, eles correriam.

Prost liderou e o que aconteceu depois continuou a ser comentado pelo restante da vida de Senna, porque Ayrton o ultrapassou na curva. É uma questão de diferentes pontos de vista, com Senna afirmando que estava no vácuo de Prost e, por isso, podia ultrapassar. Ayrton venceu a corrida, e Prost, enfurecido, foi embora do circuito imediatamente.

Eles trocaram insultos – alguns calorosos, outros ásperos – e foram ao Japão, novamente com o campeonato em jogo pelo segundo ano consecutivo. Prost liderava e Senna tentava ultrapassar, mas, nesse circuito , os pontos de ultrapassagem são poucos – na verdade, eles vão da reta de largada até a chicane. Na quadragésima sétima volta, Senna forçou por dentro, e Prost esterçou para pegar a chicane normalmente. Mas, em vez disso, ele pegou Senna. Como em San Marino, foi uma questão de diferentes pontos de vista: quem estava exatamente onde na pista, quem tinha a preferência na curva – e quem não tinha. O que ninguém pode negar é que a batida deu o campeonato a Prost.

Naquele momento, o mundo da F-1 implodiu ao redor dos seus dois principais pilotos, o que foi apimentado por uma cobertura da mídia mais adequada aos grandes desastres humanos.

Isso durou até o final de 1990 – e no Japão novamente. Prost tinha ido para a Ferrari, apesar de Ron Dennis ter sentido (e ainda sentir) que poderia ter contratado os dois pilotos para a McLaren naquela temporada de novo.

Seja como for, Berger juntou-se a Senna na McLaren e, por causa de algumas brincadeiras exageradas (e perigosas), isso trouxe uma dimensão mais humana para a equipe. Eles também se tornaram grandes amigos . Os opostos se atraem, e assim foi com os dois pilotos.

Berger era veloz e pegou a pole da primeira corrida, o Grande Prêmio dos Estados Unidos, em Phoenix, mas Senna abriu caminho de forma implacável até conquistar a liderança – empreendendo um pequeno duelo com o jovem Jean Alesi, da Tyrrell – e não a perdeu.

Depois de um intervalo de dez anos, o Grande Prêmio do Brasil voltou para Interlagos, o circuito repleto de curvas em São Paulo, e você não precisa forçar a imaginação para visualizar o quanto era importante para Senna vencer ali. Ele liderou até a quadragésima volta, com Prost em segundo, mas Satoru Nakajima perdeu controle do seu Tyrrell ao tentar sair de Senna, e eles colidiram. Ayrton fez um pit stop, mas terminou em terceiro.

Senna não terminou a corrida em Ímola, mas demonstrou sua maestria a cada volta em Mônaco. Depois, venceu no Canadá, e Prost ganhou no México. Alain continuou ampliando a diferença em Magny-Cours (Senna em terceiro), aumentando-a ainda mais em Silverstone (Senna em terceiro de novo), de forma que, na metade da temporada, Prost tinha quarenta e um pontos e Senna, trinta e nove. O campeonato havia se tornado uma luta de pesos-pesados, com cada corrida trazendo ataques e contra-ataques: Senna venceu na Alemanha (Prost chegou em quarto); Senna bateu na Benneton de Alessandro Nannini na Hungria, mas terminou em segundo na Alemanha (Prost girou e saiu); Senna venceu na Bélgica de….. Prost por 3,5 segundos. Senna fez uma corrida verdadeiramente bela, do tipo que só mesmo um homem maduro consegue fazer, liderando todas as voltas e reagindo a todos os contra-ataques de Prost. Foi sua vigésima quinta vitória, quebrando o recorde de Juan Manuel Fangio, colocando-o no mesmo nível de Jim Clark e Niki Lauda. Senna estava entre os imortais, para sempre.

Em Monza, a diferença apertou ainda mais, com Senna vencendo Prost, embora a corrida tenha demonstrado como decisões aparentemente comuns podem ter grandes consequências. Prost escolheu pneus Goodyear compostos e duros; Senna, um jogo mais macio – o que lhe permitiu liderar todas as voltas, enquanto Prost precisou dar vinte voltas antes de ultrapassar Berger e conquistar o segundo lugar.

Mansell venceu Senna e Prost (Senna tinha setenta e oito pontos, Prost sessenta) em Portugal, mas, no primeiro treino de classificação para o Grande Prêmio da Espanha, em Jerez, o Lotus de Martin Donnely bateu com violência e o piloto foi projetado para fora do carro, caindo na pista. Ele estava muito ferido e corria risco de morrer. Enquanto o professor Sid Watkins, médico residente da F-1, lutava para salvar Donnely, Senna chegou e observou. Mais tarde, Ayrton questionou Watkins o que ele tinha feito e por que fizera. Então, Senna saiu com o McLaren e conquistou a pole provisória.

Essa atitude continha dois aspectos: primeiro, Senna estava cada vez mais preocupado com a segurança na F-1 algo com que um homem que está amadurecendo começa naturalmente a se preocupar – e, segundo, mesmo tendo enfrentado fisicamente as possíveis consequências de um grande prêmio, ele fora capaz, nas palavras de Donnelly, de baixar a viseira e fazer uma volta incrivelmente rápida.

Senna liderou a corrida até a vigésima nona volta, mas um pedaço de carro se soltou e bateu no McLaren, quebrando o radiador. Ele parou o carro antes de quebrar completamente – e Prost venceu.

Eles chegaram ao Japão, a décima quinta corrida, com Senna com setenta e oito pontos e Prost com sessenta e nove. Uma vitória representava nove pontos e, se nenhum deles terminasse no Japão, Senna conquistaria o título – se Prost vencesse na Austrália, ele faria apenas setenta e oito pontos, e Senna conquistaria o campeonato por ter o maior número de vitórias na temporada.

A implosão estava prestes a aumentar e produzir um rugido primitivo e potente que ecoaria ao redor de todo o mundo. Colocando em termos simples, Senna tomou a pole de Prost e quis que a posição fosse mudada para outro lado da pista, onde havia mais aderência. Isso foi negado, pois as marcas do grid já tinham sido pintadas. Senna reagiu, tomando uma decisão extraordinária: vou pilotar a McLaren até a primeira curva com força total e, se Prost estiver lá, azar. Não será culpa minha.

Senna fez isso e a decisão do campeonato mundial ficou reduzida a uma corrida de quinze segundos até a primeira curva. Então, partes e peças de ambos os carros se espalharam por uma grande área.

A F-1 estava, literalmente aos pedaços.

Prost, disse Senna, fez a melhor largada e foi para a primeira curva na minha frente. Ele foi para dentro, mas eu sabia que meu motor tinha melhor aceleração que o dele, e, por isso, não me preocupei. Sabia que havia uma possibilidade de fazer isso na primeira curva, por isso o persegui, e, conforme chegamos a curva, ele se moveu para fora e fui buscar meu espaço. Quando fiz isso, ele se voltou para mim. Fiquei surpreso, porque isso foi totalmente inesperado para um piloto com o seu conhecimento e experiência. Naquelas circunstâncias, a batida era inevitável. Batemos de lado. Você pode ver pelas câmeras de televisão que isso foi um fato. Se eu estivesse liderando nas mesmas circunstâncias, não teria deixado espaço por dentro e, se tivesse deixado espaço, não iria, sob quaisquer circunstâncias, fechar a porta uma segunda vez. Por isso, acho que foi um grande erro tático da parte dele. Foi realmente patético ouvi-lo dizer que a corrida devia ser interrompida. Não acho que alguém pudesse afirmar que nossos carros não estava em uma posição segura.

No final, Prost me fiz rir porque ele é um cara que reclama muito, não só neste ano, mas desde que corremos juntos, como companheiro de equipe, em 1988. Ele reclamava de mim e, depois da Honda, então no ano seguinte, continuou a reclamar de mim e da Honda; reclamava da equipe, e foi a equipe com qual ele venceu três campeonatos. Então ele vai para uma nova equipe, a Ferrari, e critica a empresa de pneus por nos fornecer pneus diferentes. Daí, continua e critica Berger, depois Alesi, e a própria equipe e os diretores, e acaba criticando Mansell e termina me criticando de novo. Por isso, não me surpreendo que ele me critique com relação ao que aconteceu em Suzuka. Estou acostumado.

Toda essa controvérsia tem girado em torno de um único homem. Se ninguém chegar perto dele, e alguma coisa der errado, ele vai reclamar.

Então Prost se aposentou, o que trouxe alívio, mas, apesar de Senna ter conquistado seu terceiro campeonato mundial em 1991, os Williams-RENAULT nas mãos de Nigel MANSELL e Ricardo Patrese estavam ficando mais competitivo.

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