Ao chegar á McLaren, Senna adotou a política de boa vizinhança, no que foi devidamente correspondido pelo francês bicampeão mundial.
Ron Dennis estava exultante quando apresentou á imprensa a formação da McLaren para 1988. Tenho o prazer de apresentá-los á maior equipe do mundo: a McLaren, que agora tem o melhor motor, o Honda, e os dois melhores pilotos, Alain Prost e Ayrton Senna. Modéstia á parte literalmente, ele tinha motivos para isso. O motor Honda, que havia dominado a Fórmula 1 nas duas últimas temporadas, agora equiparia seus bólidos. E eles seriam guiados por dois pilotos que, senão os melhores, certamente se encontravam entre os quatro gigantes da época, ao lado de Nelson Piquet e Nigel Mansell.
Mas o que parecia uma vantagem incontestável poderia muito bem se tornar uma faca de dois gumes. Dois pilotos de ponta em uma mesma escuderia? A experiência da Williams havia sido terrível, basta dizer que a disputa desmesurada entre os companheiros Piquet e Mansell custou á equipe o título de 1986, que foi parar justamente na McLaren. Ao final de seu contrato, o brasileiro partiu para a Lotus disparando contra a Williams, desgastado com um suposto tratamento especial para o inglês.
Ron Dennis, porém, apresentava um case de sucesso no currículo. Entre 1984 e 1985, ele contou com os talentos de Niki Lauda e Alain Prost, que conviveram de forma pacífica e vitoriosa na McLaren, a parceria rendeu um título para cada um. O chefão pretendia usar experiência para controlar os ânimos de seus pupilos.
BANDEIRA BRANCA
Até então, Senna sempre havia preferido a tranquilidade de trabalhar sem ter um companheiro que pudesse lhe fazer sombra. Em seu segundo ano da Lotus, já com a chance de primeiro piloto, ele havia vetado a contratação do promissor Derek Warwick, obrigando a equipe a recrutar o limitado Johnny Dumfries. Á época, o brasileiro explicou que não temia a concorrência de Warwick, e sim a falta de recursos da Lotus para atender a dois pilotos do pelotão de frente. Ele acreditava que, ao dividir suas forças, a equipe acabaria minando as chances de ambos.
Na McLaren, porém, Ayrton estava confiante de que isso não aconteceria. Não á toa, tocou no assunto em uma de suas primeiras falas como piloto da escuderia, em setembro de 1987, no jantar de apresentação da equipe. Estou muito feliz porque correrei mais um ano com os motores Honda, que já provaram ser os melhores da Fórmula 1, e numa equipe que já provaram ser os melhores da Fórmula 1, e numa equipe que já provou ter condições de fazer dois carros iguais para dois pilotos de ponta, afirmou. É uma honra correr ao lado de um campeão como Alain Prost.
No papel de recém-chegado, Senna adotou desde o início a política da boa vizinhança, no que foi correspondido por Prost. Ambos trocaram elogios protocolares e pareciam dispostos a manter hasteada a bandeira branca, para alívio de Ron Dennis.
O fato de o francês já ser um veterano de McLaren, com dois títulos mundiais de Fórmula 1 no currículo, também não preocupava o confiante Senna. Teoricamente, o Prost, que é um dos melhores pilotos da Fórmula 1, se não for o melhor, teria vantagens dentro da equipe por já estar lá há muito tempo e por ser amigo de todo o pessoal. Mas a Fórmula 1 é um mundo que tem que ser entendido pela ótica do dinheiro, dos interesses em jogo. E estes interesses exigem que eu e o Prost funcionemos como uma equipe, cujo objetivo é conseguir os melhores resultados, seja com um ou com outro. É assim que tudo foi acertado, inclusive por contrato, declarou Ayrton em fevereiro de 1988, em sua tradicional entrevista coletiva de início de temporada, em São Paulo.
BONS COLEGAS
Ao menos durante a pré-temporada, o discurso foi seguido á risca. Nos testes em Jacarepaguá, em março de 1988, Senna até afirmou que a disputa seria benéfica para a McLaren. Serão duas cabeças a pensar, a procurar soluções. Mas é preciso haver condições para que estas duas cabeças pensem. Eu acredito que a McLaren nos dará condições para evoluir. A equipe já provou, outras vezes, que pode fazer isso, explicou, para apresentar em seguida uma outra teoria.
Ás vezes, não é bom ser o único piloto de uma equipe. O trabalho é maior, a responsabilidade é toda sua e não há ninguém para ajudar no desenvolvimento.
Prost deixou o Rio de Janeiro sem muitos comentários, mas fez questão de elogiar o brasileiro: Ayrton Senna mostrou que será um grande companheiro de equipe.