Ayrton Senna na sua vida pessoal; era uma pessoa simples que gostava da vida familiar e de seus hobbies

Ayrton Senna e família

Na sua vida pessoal; conta a família Senna. Ayrton era uma pessoa simples que gostava da vida familiar e de seus hobbies – aeromodelismos, esportes aquáticos. Os laços familiares eram os valores que ele mais apreciava.

Talvez a parceria natural dessa simplicidade fosse a pureza da motivação, uma capacidade de reconhecer uma paixão e se dedicar a ela de forma integral. Já vimos como se concentrava. Já ouvimos Alain Prost explicar que Senna tinha essas regras, era regido por elas e nada mais interessava. Refletindo hoje, acho realmente que acreditava que sempre estava certo, sempre dizendo a verdade – nas pistas, ele fazia exatamente a mesma coisa.

A família dá um exemplo. A história envolve Bianca, a sobrinha mais velha, que, na época, tinha onze anos. Aconteceu na casa de Senna em Angra dos Reis, a cidade litorânea para onde ele ia, enquanto era inverno no hemisfério norte.

Bianca, conta a família, pegou um dos laser disks do Beco para assistir – Madonna, que ele realmente adorava. O problema foi que o LD escorregou das mãos dela e caiu no chão, partindo-se em dois. Bianca ficou assustada, pois sabia o quanto ele gostava daquele LD. Ela o colocou de volta no lugar e fingiu que nada havia acontecido. Mais tarde, ele perguntou a ela se sabia quem tinha quebrado o seu LD da Madonna, Bianca ficou nervosa e não conseguiu mais esconder o que tinha acontecido. Confessou e pediu desculpas.

Beco, calmo como sempre, disse; não tem problema ter quebrado o LD. O problema é ter escondido isso. Você nunca deve fazer isso de novo – nem para mim, nem para ninguém e, principalmente, nem para você. Isso só vai prejudicá-la. Bianca ficou vermelha, mas, á medida que o tempo passou, ela compreendeu o que seu tio quis dizer. Hoje, ela ainda se lembra dessa lição quando as coisas dão errado – e segue o conselho que o tio lhe deu.

Isso contrasta com as lembranças de Gerhard Berger, companheiro de equipe de Senna na McLaren, claro, mas igualmente amigo. Em uma entrevista emocionante dois meses depois de Ímola, Berger disse á revista britânica Autosport: consigo separar muito bem o trabalho do lazer. Para mim, as duas coisas não têm nada a ver uma com a outra, mas consigo trazer a alegria de uma para a outra. Ayrton não conseguia fazer isso e, creio, quando cheguei a McLaren, eu o deixei ainda mais forte porque ficou mais livre. Acho que, através de mim, ele aprendeu a rir e, então, começou a fazer as mesmas coisas que eu fazia.

Por exemplo: uma vez estávamos em Milão, na minha Ferrari, e ele tirou as chaves da ignição e as jogou pela janela. Lá estava eu rastejando debaixo dos carros a procura da minha chave, o que estava ok – até que todos perceberam que éramos Senna e eu. Daí, metade da cidade ficou maluca….

Antes, Ayrton nunca teria feito nada assim – ele não teria entendido nada assim. Mas parece que descobriu um senso de humor, como se fosse algo que ele possuía, mas que nunca tinha usado.

Na verdade, Berger, Senna e Ron Dennis se engajavam em uma disputa maravilhosamente infame de colocar um ao outro em apuros por meio de artimanhas, truques e manobras. Assim, Berger colocou lagartos no quarto de hotel de Senna, e Ayrton pendurou a cueca de Berger no ventilador de teto do quarto do austríaco. E Berger colocou uma estátua na cama de Senna, e assim por diante. E agora você sabe por que Senna tirou a chave de ignição em Milão, apesar de isso violar a regra número 1 do jogo ( conforme explicou certa vez Ron Dennis ): o maior truque era se safar sem ser pego em flagrante.

Este é o Senna tão raramente visto, mesmo nas muitas gravações em vídeo que o mantém vivo.

A família relembra: durante as refeições, era sempre este ritual: ele gostava de comer devagar. As vezes, até reclamava com a mamãe porque ela estava tirando a mesa e ele ainda não tinha terminado! A comida era simples e tradicional.

Como ele passava muito tempo fora do Brasil, preferia comer comida brasileira sempre que podia, e Neyde fazia arroz, feijão, bife, salada e muita, muita massa. A exigência constante era molho. Tinha de ser molho de tomate caseiro, sem nada mais. De acordo com a mãe, ele se servia de porções generosas e gostava muito de comer.

Esse pequeno mosaico de fragmentos desconexos demonstra precisamente as qualidades humanas de Senna – o traço central muito fácil de se perder depois do que aconteceu em Ímola.