Prost provocou acidente, mas Senna voltou á pista e conseguiu o resultado que o manteve com chances de título até ser arbitrariamente desclassificado.
Um ano depois de conquistar, em terras nipônicas, seu primeiro título mundial de Fórmula 1, Ayrton Senna voltava a Suzuka tentando manter vivo o sonho do bicampeonato. Não seria fácil: agora, o brasileiro precisava vencer os dois Grandes Prêmios que faltavam ( Japão e Austrália) e ainda torcer para que seu rival, Alain Prost, não fizesse mais do que dois pontos nessas duas corridas. Pelo retrospecto da temporada, era algo improvável: das 14 etapas disputadas até então, Prost havia terminado 13 vezes na zona de pontuação, sempre conseguindo dois pontos ou mais.
Sem a necessidade da vitória, portanto, esperava-se que o francês ficasse longe de qualquer disputa mais acirrada e se preocupasse apenas em levar sua McLaren ao final da prova. Por isso, na teoria, a maior ameaça á vitória de Senna viria, mais uma vez, das Ferrari. No Japão, a equipe italiana contava novamente com seus dois pilotos: Gerhard Berger e Nigel Mansell. O inglês voltava da suspensão cumprida no Grande Prêmio da Espanha após a confusão provocada por ele no Grande Prêmio de Portugal, quando desrespeitou a bandeira preta e provocou o acidente que tirou Senna da disputa daquela corrida.
Apesar da intensa expectativa que cercava a prova que poderia decidir o título e do grande desafio que se colocava á sua frente, Ayrton estava em paz com a situação. Amadureci nestes 12 meses. Vou dormir como qualquer outro dia de corrida. Não tenho nada a perder, tudo agora é lucro, garantiu. Nosso desafio é acertar bem o chassis, nos mínimos detalhes. É preciso num acerto fino, o melhor possível para competir.
POLE VOADORA
Nos treinos, Senna foi absoluto. Registrou o melhor tempo na sexta-feira (1m39s493), superando em pouco mais de um segundo seu concorrente mais próximo, Nigel Mansell (1m40s608). No sábado, porém, o brasileiro se superou. Conquistou a pole com a incrível marca de 1m38s041 nada menos do que 1s730 mais rápido do que Alain Prost, que terminou com o segundo melhor tempo (1m39s771). Na segunda fila, vinham as Ferrari de Berger e Mansell, respectivamente terceiro e quarto colocados.
A lógica do roteiro que se imaginava para a corrida de 22 de outubro de 1989, porém, começou a se alterar logo na largada. Prost assumiu a ponta antes mesmo da primeira curva, aproveitando uma saída ruim de Senna, que por pouco não perdeu a posição também para Berger. E o francês, ao contrário do que muitos pensavam, resolveu pisar fundo e conseguiu abrir uma boa vantagem sobre o companheiro de equipe.
As Ferrari, por sua vez, decepcionaram. Sem conseguir acompanhar as McLaren de perto, Berger e Mansell viram Alessandro Nannini, da Benetton-Ford, se aproximar. E o italiano herdou o terceiro lugar depois dos abandonos sucessivos do austríaco (na volta 34, por problemas na caixa de câmbio) e do inglês (na volta 44, por causa do motor).
MANOBRAS FRANCESAS
A disputa pela liderança, então, era mais uma vez exclusiva de Prost e Senna. Por volta da metade da prova, o brasileiro já havia pulverizado a diferença entre ambos, colocando intensa pressão sobre o francês. Com o melhor acerto para as curvas, Ayrton até chegava perto do líder, mas a retomada da aceleração de Prost era melhor e impedia que Senna pegasse o vácuo. Seria preciso, então, buscar uma manobra ousada.
E foi o campeão mundial fez na volta 46, ao colocar sua McLaren por dentro na chicane para passar o francês. O contra-ataque, porém, ficou evidente aos olhos de todos os espectadores: Prost simplesmente fugiu do traçado normal da curva e atirou seu carro para cima de Ayrton, forçando a batida. Para o líder do campeonato, era bom negócio: com ambos fora da prova, Prost garantia o campeonato mundial. Após a colisão, as duas McLaren pararam lado a lado na entrada da chicane, mas, enquanto Prost saía do carro, Senna fazia sinal para os fiscais o empurrarem – e assim, para incredulidade do francês, o brasileiro voltou á pista.
Com o bico avariado, Ayrton precisou parar no box; ao retornar, faltando cinco voltas, estava cerca de 5 segundos atrás de Nannini, o novo líder. Em um único giro, porém, Senna tirou essa vantagem e colou no italiano. A ultrapassagem veio a duas voltas do final, no mesmo ponto do circuito em que Senna tentara passar Prost. Uma vitória histórica, que, minutos depois de conquistada, lhe foi subtraída pelos comissários.
Ayrton foi desclassificado da prova por retornar á pista por fora da chicane. Imediatamente, a McLaren recorreu da decisão. O resultado do Grande Prêmio do Japão ficava então em suspenso; a confirmação aconteceria apenas nos tribunais. Mas era Nannini quem comemorava, no pódio, a vitória. E Prost, nos boxes, sorria. Afinal, se ele não pudesse contar com Jean-Marie Balestre, que poderia?