A corrida aconteceria no distante autódromo de Kyalami, mas os dois pilotos brasileiros, motivados pelo bom desempenho de suas máquinas nos treinos classificatórios, estavam se sentindo em casa na África do Sul. Embora com metas distintas, Nelson Piquet e Ayrton Senna respiravam o mesmo otimismo para o segundo GP da temporada de 1984.
Piquet mostrou sua intimidade com o circuito sul-africano e registrou a pole-position com direito a quebra de recorde oficial da pista: 1m04s871, velocidade média de 227,69 km/h.
Além de ser impulsionada pelo poderoso motor BMW, sua Brabham era equipada com pneus Michelin – de rendimento superior aos Goodyear de Keke Rosberg, da Williams, e Nigel Mansell, da Lotus, segundo e terceiro tempos. Por tudo isso, Piquet era o grande favorito em Kyalami.
Senna, por outro lado, tinha pretensões proporcionais as possibilidades de seu Toleman/Hart com pneus Pirelli – e, por isso, celebrou bastante a 13a posição no grid. A marca de 1m06s981 o posicionou a frente de Ricardo Patrese e Andreas de Cesaris, primeiro e segundo colocados da prova no ano anterior, e o deixou a apenas seis milésimos de segundo de Manfred Winkelhock, o mais rápido entre os que corriam com pneus Pirelli. A diferença era que o alemão da ATS tinha um motor BMW, ao menos 100 cv mais potente do que o Hart 415-T do brasileiro. De qualquer forma, para Senna, o maior objetivo era terminar a prova; chegar a zona de pontuação, em sua segunda disputa na Fórmula 1, seria a glória – que até poderia estar a seu alcance, por que não?
Estou muito entusiasmado para essa corrida. Meu carro está perfeitamente equilibrado e, mesmo com o tanque de combustível cheio, ele está mais estável e fácil de guiar que em qualquer momento do GP do Brasil, declarou Senna, elogiando os pneus Pirelli e acenando com uma possível estratégia para a prova. Eles não perderam a aderência mesmo quando gastos. Pode ser que na corrida eu nem pare para trocá-los.
APREENSÃO E ALÍVIO
Quatro horas antes da largada, durante os treinos livres da manhã de 7 de abril de 1984, um susto em Kyalami; a Osella de Piercarlo Ghinzani chocou-se a 220 km/h contra um guard-rail, em um impacto que fez o carro partir-se em dois e arder em chamas. A lembrança do acidente que vitimara Ricardo Paletti – também italiano e também da Osella – no GP do Canadá de 1983, menos de um ano antes, foi inevitável. Milagrosamente, nada de mais sério aconteceu com Ghinzani, que sofreu apenas cortes e queimaduras leves.
DRAMA COM FINAL FELIZ
Quando os motores roncaram para o Grande Prêmio da África do Sul, os brasileiros perceberam, a duras penas, que o roteiro idealizado antes da corrida não seria encenado na prática.
Piquet liderava a prova até a 22a volta, quando parou para trocar os pneus; no retorno, voltou em sexto, recuperando as posições até chegar ao segundo lugar. Estava então atrás de Niki Lauda, da McLaren, e parecia que era questão de tempo para recuperar a ponta – mas, na 30a volta, voltou para o box da Brabham e abandonou, com problemas no turbo.
Senna, por outro lado, sofreu desde as primeiras voltas – mas teve seu esforço recompensado. Logo no início da prova, o bico da Toleman se soltou, deixando o carro pesado e duro de dirigir. Fiel a estratégia de não parar nos boxes, Ayrton pesou os riscos e manteve na pista.
Chegou a cair para o 15a colocação; no entanto, com as quebras e os pit stops dos pilotos que estavam a sua frente, avançou até o sétimo lugar, quando finalmente precisou parar também para trocar os pneus, a essa altura já impraticáveis. O brasileiro voltou na décima posição e contou com os abandonos de Jacques Lafitte, Stefan Bellof, Patrick Tambay e Michele Alboreto para cruzar a linha de chegada na tão almejada sexta colocação.
Ao chegar nos boxes, o esforço físico para controlar o carro finalmente cobrou seu tributo: esgotado, com dores nos ombros e câimbras no pescoço, Senna desmaiou e foi levado ao centro médico do autódromo, onde ficaria sob observação por quase duas horas.
Ele e seu primeiro pontinho na Fórmula 1. Valeu a pena.