A convite da Joest Racing, Ayrton Senna pilotou o icônico Porsche 956 na quarta etapa do World Endurance Championship.
Esporte protótipo, endurance, mundial de marcas. Ao longo do tempo, os nomes variaram – mas não o prestígio da categoria, uma das mais tradicionais do automobilismo internacional. Trata-se do supremo teste de durabilidade para os carros e de resistência para os pilotos, acrescido pela mística de provas como as 24 Horas de Le Mans ou os 1.000 km de Nurburgring, ambas disputadas desde 1953.
Na primeira metade da década de 1980, o campeonato dos protótipos atendia oficialmente por World Endurance Championship ( WEC ) e, como em outros períodos, costumava receber em suas etapas pilotos de Fórmula 1, aposentados ou na ativa. Foi assim que Ayrton Senna, então piloto da Toleman, recebeu o convite para pilotar o Porsche 956 da New Man/ Joest Racing nos 1.000 km de Nurburgring, marcado para 15 de julho de 1984. A ideia partiu do português Domingos Piedade, team manager da equipe, e foi bem-recebida pelo alemão Reinhold Joest, dono da escuderia. O brasileiro topou de pronto, celebrando o fato de voltar ao circuito, dois meses antes, havia vencido ali a Corrida dos Campeões com um Mercedes 190E. Aceitei esse honroso convite pois assim terei oportunidade de me familiarizar com provas de longa duração, onde logicamente somos mais solicitados fisicamente, e também para fazer um treino extra tendo em vista o Grande Prêmio da Europa, a ser realizado nesse circuito no dia 7 de outubro, afirmou o piloto, em declaração reproduzida pelo Jornal dos Sports em 13 de julho de 1984.
UMA SUPERMÁQUINA
Nos 1.000 km de Nurburgring, Ayrton Senna dividiu com o francês Henri Pescarolo e com o sueco Stefan Johansson o comando do Porsche 956, equipado com motor V6 de 2.600cc e dois turbo compressores. Na etapa anterior do WEC, esse mesmo carro, pilotado por Pescarolo e pelo alemão Klaus Ludwig, colocara a New Man/ Joest no topo do pódio em Le Mans.
Senna jamais havia pilotado um protótipo, e foi o próprio Joest que fez as honras da casa assim que o brasileiro chegou a Nurburgring. Eu mostrei o carro e expliquei tudo que ele deveria ou não fazer. Ele ficou imediatamente feliz com o Porsche, declarou Joest ao piloto brasileiro Lucas Di Grassi, que fez uma ponta de repórter para o canal Senna TV em 2016. Ayrton foi imediatamente o mais rápido. Depois das, digamos, dez primeiras voltas, ele retomou e disse. Ok, mas precisamos mudar algo no carro imediatamente! Então, nós fizemos alguns ajustes, e no segundo treino a mesma coisa: ele foi rápido o suficiente.
CHEGADA COMEMORADA
Senna fez o sétimo melhor tempo de classificação; com a soma dos tempos dos companheiros, porém, o carro da New Man/ Joest Racing largou um pouco mais atrás, na nona posição. E vinha fazendo excelente corrida até que, com cerca de três horas de prova, cerca de metade do total, precisou parar no box com problemas na embreagem, foram 17 minutos para o reparo do encanamento do óleo para a fricção, tempo que afastou definitivamente o trio da briga pelas primeiras posições.
Ainda assim, Senna, Pescarolo e Johansson voltaram e conseguiram orgulhosamente terminar a prova na oitava colocação. A vitória ficou com a dupla da Rothmans Porsche: o alemão Stefan Bellof, que também corria na Fórmula 1, pela Tyrrell, e o inglês Derek Bell. Considerando um dos pilotos de maior futuro na Fórmula 1, ao lado de Ayrton Senna, Bellof venceu naquele ano o título da World Endurance Championship. Mas sua carreira foi abreviada de forma trágica na temporada seguinte, quando sofreu um acidente fatal em seu Porsche 956B durante os 1.000 km de Spa.
PAIXÃO DE PROFISSIONAL
Depois da corrida, Ayrton ficou umas quatro horas conversando conosco, dando sugestões para deixar o carro mais rápido.
Ele queria conhecer tudo sobre o 956. Trabalhou de maneira muito profissional para nós, lembrou Reinhold Joest, em depoimento registrado pelo jornalista Tony Dodgins no livro Senna: All His Races. Senna manifestou interesse em voltar a correr com um protótipo no futuro, mas as obrigações cada vez maiores na Fórmula 1 acabariam tomando a ideia inviável. A partir de 1985, não haveria mais tempo para distrações.