Enquanto a maioria dos pilotos detestava correr nas ruas de Mônaco, Senna se sentia muito á vontade por ali – e as vitórias eram a prova disso.
O Grande Prêmio de Mônaco é como andar de bicicleta na sala de casa, afirmou Nelson Piquet, certa vez. A frase ficou famosa no meio da Fórmula 1. Em conversa com o jornalista Celso Itiberê, de O Globo, em maio de 1991, o piloto carioca detalhou sua antipatia pela corrida no principado. Você pega velocidade, e, quando começa a ficar bom, tem de parar e fazer meia volta. Mas a verdade é que nos primeiros anos que guiei aqui, quando saía do carro passava muito mal, vomitava, sentia tonturas. Entrar no carro era um sacrifício. Acho que isso me marcou.
Muitos pilotos, de fato, consideravam que as ruas de Monte Carlo não ofereciam condições propícias para uma disputa entre carros de corrida – apesar do glamour que cercava a prova, uma das mais tradicionais e badaladas do automobilismo mundial. Primeiro, que você não tem como ultrapassar. Se tiver motor, tudo bem. Mas se não tiver e chegar lá no braço, a ultrapassagem de um carro do mesmo tope é quase impossível, garantiu Piquet. Segundo, você não vê as curvas, faz voo cego em várias delas e isso é uma coisa difícil, tensa, complicada. E tem mais: se os pneus saem da linha da trilha, o carro vai embora, fica incontrolável, porque o resto do asfalto não tem aderência.
Triunfar em Mônaco certamente não era tarefa fácil, nem mesmo para pilotos do pelotão de elite. Piquet já havia corrido por lá 12 vezes; fez a pole uma vez, conseguiu dois segundos lugares, mas nunca subiu ao degrau mais alto do pódio. Emerson Fittipaldi também chegou a largar na frente, mas, assim como Piquet, jamais recebeu a bandeira quadriculada de vencedor.
Com quatro poles e três vitórias na bagagem, Senna, por sua vez, não tinha do que reclamar de Mônaco – e não apenas porque era o local de sua residência na Europa. Gosto daqui, afirmou categoricamente antes da prova de 1991. Apesar das críticas que são feitas, os organizadores estão sempre procurando melhorar o circuito. Este ano, por exemplo, alargaram a pista na saída do túnel para a chicane e isso pode criar um novo ponto de ultrapassagem.
DE OLHO NO LEÃO
Como liderou de ponta a ponta, sempre resguardado por uma excelente margem de segurança para o segundo colocado, Senna não precisou se engajar – nem se arriscar – em batalhas acirradas por posições. Mas, Ayrton á parte, a prova esteve longe de ser monótona. Nesse ponto, o destaque foi o inglês Nigel Mansell, da Williams, que, de maneira espetacular, ultrapassou Alain Prost a 15 voltas do final para garantir a segunda colocação. A manobra foi ousada: uma ultrapassagem com uma freada já dentro da curva, na chicane, depois do túnel. Quem falou que não era possível?
Até mesmo Ayrton Senna fez elogios ao arrojo do inglês, um antigo desafeto com quem, aparentemente, já havia aparado as arestas ( no pódio, ambos divertiram-se trocando jatos de champanhe ). O brasileiro, aliás, assistiu á ultrapassagem de dentro do seu cockpit, durante corrida, no telão colocado pela organização da prova na subida para o cassino. Vi a manobra do Mansell passando por dentro, freando bem dentro da curva, e, quando ele saiu na frente, pensei: o homem certo, no lugar certo.
Prost terminou em quinto – uma volta atrás de Senna – e preferiu passar reto pelos jornalistas após a prova. Sem comentários, declarou ele, que andava em pé de guerra com a Ferrari. Entretanto, dessa vez, seu companheiro de equipe Jean Alesi fez declarações por ambos. Nós mudamos muita coisa, partimos para a tática da tentativa e erro, mas nada adiantou e o carro continuou muito difícil de dirigir, com pouca estabilidade, afirmou o francês, garantindo que seu carro saltava como um cabrito. Com ele, vamos sempre ser derrotados pela McLaren.
NADA DECIDIDO
Para Senna, não era bem assim. Apesar da grande vantagem aberta no campeonato, ele sabia que as outras equipes, mais cedo ou mais tarde, se acertariam e fariam frente á McLaren. É uma bobagem achar que tudo está acabado, que a McLaren é imbatível. Meu carro está bom, mas acho que qualquer piloto poderá derrotar a McLaren. A nossa vantagem não é tão grande como parece, e é por isso que sou tão exigente com a McLaren e com a Honda, justificou. Até aqui as circunstâncias estão nos ajudando, tudo está dando certo. Eu trabalho para melhorar sempre a nossa competitividade, porque quero ganhar e não pretendo ser alcançado. Mas eles estão se empenhando e também dão duro. Amanhã, as circunstâncias poderão favorecê-los, o carro deles poderá ganhar mais competitividade e o campeonato mudará de figura.