De forma surpreendente, Senna e Prost se abraçaram no pódio em Adelaide e fecharam em paz uma das maiores rivalidades da história da Fórmula 1.
Nas duas últimas corridas de 1993, a Fórmula 1 se preparava para a aposentadoria definitiva de Alain Prost, anunciada logo após a conquista de seu tetracampeonato, no Grande Prêmio de Portugal. Entre homenagens, desabafos e lágrimas, uma questão permanecia sem resposta. Como seria escrito o capítulo final da longa rivalidade entre Prost e Ayrton Senna?
Em clima de despedida, o francês parecia querer estender a bandeira branca. Eu acho que a situação é difícil porque nós não sabemos o que fazer um com o outro. Chegamos a um ponto em que, toda vez que há a minha tentativa do primeiro passo, Ayrton dá um sorriso debochado ou diz alguma coisa, afirmou Prost, após o Grande Prêmio do Japão, penúltima prova do calendário. Falta apenas uma corrida para a minha despedida e eu penso que podemos, depois dela, nos reconciliar. Espero que aconteça. Será, pelo menos, bom para o esporte.
Senna, por outro lado, não quis fazer previsões. Mas ressaltou que a paz era altamente improvável. Já houve uma aproximação entre nós. Estendi a mão para ele e fui apunhalado no dia seguinte. Não quero que isso se repita. Alain Prost prejudicou a minha vida profissional. Por duas vezes impediu que eu fosse para uma equipe, primeiro na Ferrari, em 1990, e este ano, na Williams. Muita coisa aconteceu entre nós que não pode ser esquecida. Não acredito nessa história de paz. Isso é conversa fiada.
HÁ ESPERENÇA?
Quando o circo desembarcou na Austrália, o tema ressurgiu de imediato. Novamente, Prost mostrou-se esperançoso. Acredito que, terminada a corrida, nós poderemos nos entender, porque na minha opinião essa paz é importante não apenas para os dois, mas para o esporte como um todo. Não quero dizer mais nada agora. Vamos esperar para ver o que acontecerá depois do Grande Prêmio.
Senna, que vinha de uma semana de férias no Taiti, tentou se esquivar do assunto, mas acabou dando breves respostas. Já me arrependi uma vez de ter apertado sua mão, porque ele me traiu no dia seguinte. Mas vamos ver…. Quem sabe. Aos jornalistas franceses, declarou: Não sei se faremos as pazes. Temos muitas divergências. E depois, na coletiva oficial, encerrou o assunto de forma irônica. Maybe we kiss each other.
DESISTO
Como Ayrton não parecia interessado em uma possível aproximação, Prost jogou a toalha. E foi além: na véspera do Grande Prêmio da Austrália, mudou o discurso e bradou que agora também ele não queria mais saber de reconciliação. O que ele tem a perdoar? Essa me parece a pergunta mais importante. Eu, seguramente, tenho muito mais do que ele a perdoar e não fico fazendo cenas. Tentei a paz várias vezes, mas não deu certo, e agora estou consciente de que não temos nada mais a dizer um ao outro. Eu tentei.
Na última vez que o fiz, um mês depois, ele bateu no meu carro, deliberadamente, a 260 km/h. Não sou hipócrita, e é muito tarde para as coisas mudarem. A paz agora seria boa apenas para ele. Senna preferiu se manter em silêncio. Mas seria por pouco tempo.
A PAZ EM DOIS ATOS
Logo após a prova em Adelaide, sua última pela McLaren, Senna estacionou no reservado dos vencedores e cumprimentou Ron Dennis. Prost, segundo colocado, também estava por ali, sem jeito, evitando qualquer troca de olhares. Quando Damon Hill encostou sua Williams e os três pilotos se preparavam para subir a escada em direção ao pódio, Senna surpreendeu ao estender a mão a Prost, que o cumprimentou de volta, acompanhado de um sorriso. Ayrton já estava emocionado.
O segundo ato aconteceu já no pódio. Ao final do Hino Nacional Brasileiro, Ayrton estendeu novamente a mão para Prost, durante o cumprimento, o brasileiro puxou Prost para o degrau mais alto. Prost aceitou. Com o gesto, escrevia-se o tão esperado desfecho. Nada mais era necessário.