Após um período de dedicação aos negócios da família, Senna voltou as pistas e venceu, com sobras, os campeonatos Inglês e Europeu da categoria.
Foram cerca de cinco meses de um dilema pessoal.
Entre o final de 1981 e o começo de 1982, Ayrton Senna encontrava-se fisicamente no Brasil, atuando como braço-direito do pai na administração das empresas da família. Mas sua cabeça, todos podiam perceber, estava na Europa, girando no ritmo dos acertos das equipes para a temporada automobilística que se iniciaria em semanas.
Seu Milton, então, resolveu deixar nas mãos do filho a decisão de voltar ou não para a Inglaterra – onde Ralph Firman e Dennis Rushen o esperavam com um carro de Fórmula Ford 2000.
Alguns dias depois, claro, Ayrton já estava acelerando em Snetterton.
Sem a ajuda do meu pai, as coisas teriam sido muito mais difíceis, com certeza. Mas fizemos um acordo: no dia em que eu estivesse em condições, reembolsaria todo seu investimento. Isso aconteceu quando cheguei a Fórmula 1, revelou o piloto no livro The Hard Edge of Genius, de Christopher Hilton.
Senna chegou pouco antes da corrida de estreia da temporada, em Brands Hatch, dia 7 de março de 1982 – teve tempo de testar seu Van Diemen RF 82 da equipe Rushen Green em apenas duas ocasiões. Mas isso não o impediu de conquistar a pole, fazer a volta mais rápida da prova e cruzar a linha de chegada com quase 10 segundos de vantagem sobre o segundo colocado, o irlandês Calvin Fish.
Ambientei-me rapidamente ao carro, que, na minha opinião, tem as mesmas características de dirigibilidade do kart. Tenho uma extensa programação de treinamentos ainda pela frente, razão pela qual creio que vou andar ainda mais nas provas do dia 27, em Oulton Park, e dia 28, em Silverstone, previu ao Jornal do Brasil de 8 de março de 1982.
ULTRAPASSANDO FRONTEIRAS
A bola de cristal de Senna estava correta. Na sequência da temporada, o brasileiro engatou mais cinco vitórias consecutivas no Campeonato Inglês, sempre com pole e volta mais rápida. Senna também estava disputando, em paralelo, o Campeonato Europeu, com etapas na Bélgica, Holanda, Alemanha, Áustria, Irlanda e Dinamarca, além da Inglaterra. Nesta competição, o começo de Senna não foi tão auspicioso: três abandonos nas quatro primeiras corridas. Mas, já na metade da temporada, Senna se encontrava confortavelmente na liderança – e a manteria até o final, sagrando-se campeão britânico e europeu de Fórmula Ford 2000, sem muita dificuldade.
Os números finais do ano foram assombrosos: 28 provas. 21 vitórias, 22 melhores voltas e 15 poles. Na contagem final dos pontos, Senna bateu Fish por 376 a 271 no Campeonato Inglês e por 140 a 83 no Europeu.
UM PASSO POR VEZ
Quando já despontava como provável campeão de ambos os torneios, em julho, o brasileiro atraiu seu primeiro patrocínio de peso: o Banco do Estado do Rio de Janeiro ( BANERJ ). Na segunda metade da temporada, a instituição passou a estampar sua marca no capacete, no macacão e no carro de Senna, aliviando sensivelmente o gasto da família com as despesas do piloto.
Em 23 de julho de 1983, Ayrton esteve na capital fluminense para assinar o contrato com o Banerj. Diante do sucesso estrondoso na Fórmula Ford 2000, os jornalistas o questionaram de um salto para a Fórmula 1 – até porque a McLaren e a Tyrrel, de fato, já o haviam sondado em 1982.
E a resposta do piloto demonstrou outro de seus diferenciais: a maturidade incomum, do alto de seus 22 anos, na gestão da própria carreira.
Tenho que ter calma e paciência para me decidir. Têm surgido várias propostas, mas sei que devo seguir num processo. Não posso ir direto a Fórmula 1. Tenho grandes chances de fazer ainda este ano algumas provas de Fórmula 3, onde devo correr em 83, afirmou ao Jornal do Brasil de 24 de julho. Um carro Fórmula 1 é uma obra-prima e para se chegar a ele é necessário aprender bastante. É isso que estou fazendo.