Novata no mundo da Fórmula 1, a equipe dirigida por Alex Hawkridge queria ir além do possível – e enxergou em Ayrton Senna seu piloto ideal.
Desde a entrada da Toleman no circo da Fórmula 1, na temporada de 1981, ficou claro para os especialistas que, apesar de pequena, aquela equipe tinha algo de diferente das demais que frequentavam o último pelotão. Não eram os resultados, pois estes foram péssimos. Na primeira temporada, seus pilotos só conseguiram se qualificar para as duas corridas, uma vez com Brian Hanton e a outra com Derek Warwick. No ano seguinte, as largadas até se tornaram regulares, mas o problema agora era chegar ao término das provas – feito que Warwick alcançou em apenas duas oportunidades, e Teo Fabi, substituto de Hanton, tentou a temporada inteira, sem sucesso.
Mas a verdade é que a equipe de profissionais da Toleman, chefiados por Alex Hawkridge, era jovem, talentosa e ousada – extraindo o máximo do pequeno orçamento e estrutura que Ted Toleman, dono da escuderia e aventureiro profissional, podia lhes oferecer. E, assim, os engenheiros Rory Byrne e Pat Symonds finalmente conseguiram, na segunda metade da temporada de 1983, fazer do Toleman com motor turbo Hart um carro confiável: Warwick não apenas terminou as últimas quatro corridas do ano como ainda o fez na zona de pontuação: dois quartos lugares, um quinto e um sexto. Bruno Giacomelli, seu companheiro de equipe, também terminou três das últimas quatro provas, alcançando um sexto lugar.
A boa campanha de Warwick na temporada, com um honroso nono posto na classificação final, lhe valeu um contrato com a Renault para o ano seguinte. Mas Hawkridge não lamentou a saída de seu principal piloto. Os olhos do chefe de equipe já estavam voltados para o futuro – um futuro que tinha nome e sobrenome: Ayrton Senna.
BOM PARA O MORAL
Se é que alguém ainda duvidava dos talentos de Senna na escuderia de Brentwood, os testes do brasileiro em Silverstone, em 9 de novembro de 1983, foram a pá de cal para os descrentes. Senna tem o potencial de campeão de Fórmula 1. Ele é o homem que preciso para levantar a moral da minha equipe, afirmou Alex Hawkridge, entusiasmado até demais, para a correspondente de O Globo, Gláucia da Matta Machado, em declaração publicada no jornal do dia seguinte.
O chefe de equipe não se segurou: ao final do teste, já fez o convite oficial para Ayrton Senna. Como ainda estava em negociações com a Brabham, o brasileiro, satisfeito com a estabilidade do carro da Toleman, colocou a oferta no bolso do colete para resgatá-la caso não houvesse o acerto com a escuderia de Bernie Ecclestone. Foi o que aconteceu.
No final do ano, portanto, a oferta da Toleman era a única que repousava sobre a mesa de Ayrton Senna. Mas quem achava que a situação forçaria Senna a aceitar qualquer negócio, no estilo pegar ou largar, se enganou redondamente: as tratativas do contrato com a Toleman forma duríssimas e consumiram quase dois dias, com Ayrton checando por telefone com seus advogados no Brasil cada cláusula do documento.
A negociação foi absolutamente unilateral. Ayrton conseguiu o que queria. Não era dinheiro, dinheiro não era o problema. Eram condições do contrato, e em especial as cláusulas de rescisão do contrato, relembrou Alex Hawkridge em depoimento ao jornalista Christopher Hilton, no livro The Hard Edge of Genius.
Antes de assinarmos o contrato, ele me disse: Se o carro não for bom o suficiente e se vocês me proibirem de mudar para outra equipe, eu abandono o automobilismo. Vocês não podem me obrigar a pilotar um carro. Ou vocês colocam um termo no contrato que me permita aproveitar outra chance, caso ela apareça, ou vocês não deixam outra opção senão largar o esporte se eu não achar que o carro de vocês for competitivo. Eu ficarei com vocês o quanto for possível e me entregarei 100% cada vez que entrar no carro.
O que você pode dizer para um cara que te diz isso? Hawkridge, claro, disse sim – e o negócio foi fechado.
PONTOS, NÃO VITÓRIAS
No dia 14 de dezembro de 1983, Senna esteve no escritório do empresário Armando Botelho, na Vila Maria, em São Paulo, para uma coletiva de imprensa em que explicou os detalhes do acerto: três anos de contrato, com uma multa de rescisão, não muito grande, como explicou O Estado de São Paulo de 15 de dezembro. Acho que haverá menos cobranças, pois todos sabem que a Toleman nunca ganhou provas. Meu objetivo será conseguir pontos e não vitórias no primeiro ano de Fórmula 1. A sorte estava lançada.