Vitória de Ayrton Senna foi a primeira de um piloto brasileiro nas ruas do principado – e a primeira das seis conquistas em Monte Carlo.
Tradição. Charme. Prestígio. Glamour. E, na edição de 1987, polêmica. Muita polêmica. O Grande Prêmio de Mônaco, quarta etapa do Mundial de Fórmula 1 daquela temporada, já vinha dando o que falar bem antes da sua largada, marcada para 31 de maio. Isso porque os dirigentes haviam decidido ampliar de 20 para 26 o número de carros no grid, acabando com o limite que visava manter a segurança nas estreitas ruas do principado. Com essa tacada, os cartolas garantiam a presença de todas as equipes em Monte Carlo e, não menos importante, a visibilidade de seus respectivos patrocinadores na mais badalada disputa da categoria.
A resolução unilateral revoltou os pilotos e chegou a colocar em dúvida a realização da prova. No final das contas, como de praxe, foi feita a vontade das autoridades, mas as estrelas do espetáculo dessa vez não se calaram. Isto é um absurdo, é uma loucura, disparou Alain Prost, da McLaren, após o primeiro treino oficial, em 28 de maio. Os dirigentes querem faturar e pronto. Nós, pilotos, que nos danemos. Isso tem que mudar. E espero que mude mesmo, porque senão vou para a Suíça esquiar e deixo as corridas para os senhores engravatados.
Naquele mesmo dia, um acidente envolvendo o italiano Michele Alboreto, da Ferrari, e o alemão Christian Danner, da retardatária Zakspeed, deu força aos argumentos aos pilotos: superlotar a já abarrotada pista seria um risco desnecessário para a disputa. A Ferrari entrou com uma representação contra Danner, que, como punição, teve sua participação na corrida vetada. Dessa forma, apenas 25 carros alinhariam no grid. Menos mal.
PEQUENO PRÍNCIPE
Tanto os treinos da quinta-feira quanto os do sábado tiveram um mesmo roteiro. Nigel Mansell, com sua poderosa Williams em ponto de bala, foi sempre o primeiro, cravando no sábado a pole position com 1m23s039. Atrás dele, Ayrton Senna seguia a tirar leite de pedra de sua Lotus ainda desconjuntada; o brasileiro ficou com o segundo melhor tempo, 1m23s711. Nelson Piquet, da Williams, e Alain Prost, da McLaren, formavam a segunda fila.
O carro está maravilhoso, acho que estou girando melhor do que nos anos anteriores e, se não for campeão agora, achoa que não serei mais, afirmou Nigel Mansell, que, com todas as razões do mundo para estar otimista, garantiu que não daria chances a Alain Prost, então apelidado Pequeno Príncipe por ter vencido as três ultimas edições em Monte Carlo. O Prost que me perdoe, mas não vou deixar ele ganhar pelo quarto ano consecutivo aqui. Mal sabia ele que, naquele ano, Mônaco começava a coroar um rei.
SOBERANO BRASILEIRO
Ayrton sonhava em roubar a ponta na largada, mas Mansell saiu muito bem e disparou na frente. O brasileiro então optou por ser manter a sua distância segura do inglês, ao mesmo tempo em que abria uma folga para Piquet, o terceiro colocado, que também preferiu não atacar a Lotus do compatriota.
Na primeira volta, Alboreto passou o Prost e assumiu a quarta colocação; depois disso, tudo se manteve rigorosamente igual no pelotão de frente, sem trocas de posições entre os cinco primeiros colocados até a 29a volta, quando a corrida teve seu destino alterado. Subitamente, Nigel Mansell perdeu potência; após ser ultrapassado por Senna, recolheu sua Williams para o box e não teve outra saída senão abandonar devido a problemas no turbo.
Com uma ampla vantagem na liderança, Senna estava a 48 voltas de se tornar o primeiro brasileiro a vencer um Grande Prêmio de Mônaco. A proximidade do feito histórico fez Ayrton redobrar a cautela, entrando em cada curva com o máximo de cuidado e aguardando o melhor momento para ultrapassar os retardatários. Por força do hábito, porém, acelerou no 72a giro e registrou a volta mais rápida da prova, com 1m27s685.
Ao receber a bandeirada de sua quinta vitória na Fórmula 1, seguido por Piquet e Alboreto, Ayrton Senna realizava mais um de seus desejos. Qual guri que gosta de carro não sonhou um dia vencer em Mônaco?, comemorou. Estou contente, muito contente. Como um menino que acaba de receber um presente do Papai Noel. E que fez uma travessura na cerimônia de premiação, quebrando o protocolo e espirrando champanhe no príncipe Rainier III e na princesa Caroline, para desespero do segurança real. Era um indício de que já se sentia em casa naquele pódio.