O COMEÇO DA DISCÓRDIA NA MCLAREN; ULTRAPASSAGEM NADA SUAVE

Senna e Prost discutiram no box após a prova em Imola; o francês acusou o brasileiro de descumprir o acordo feito as duas largadas.

Aos olhos de quase todos – equipe, imprensa, espectadores, a vitória de Ayrton Senna no Grande Prêmio de San Marino de 1989 foi limpa e incontestável. Mas Alain Prost garantia ter motivos para discordar.

Após a prova, o francês estava possesso. Não apareceu para a entrevista coletiva dos vencedores, alegando uma indisposição estomacal, mas a essas alturas a notícia da confusão que chacoalhara o box da McLaren já havia se espalhado pelo circuito. Senna e Prost discutiram fortemente, com o francês revoltado pela ultrapassagem do brasileiro sobre ele logo após a segunda largada.

Alain Prost considerou a manobra uma quebra no acordo verbal acertado na paralisação da prova. Tratava-se de um pacto de não agressão nas primeiras curvas, para evitar acidentes. Não era algo inédito: no Grande Prêmio da Bélgica de 1988, por exemplo, eles já haviam combinado que aquele que saísse na frente teria a posição garantida nas curvas seguintes.

Testemunha da discussão, um comissário de corrida, cuja a identidade foi preservada, relatou o conteúdo da conversa ao correspondente Milton Coelho da Graça, de O Globo, e suas declarações foram reproduzidas nas páginas da edição de 24 de abril do jornal carioca. Prost teria dito que o brasileiro traiu sua confiança ao fazer a ultrapassagem e que o brasileiro não seria uma pessoa de palavra.

O jornalista também conversou com fontes da McLaren, que afirmaram que Ayrton Senna, garantiu não ter descumprido o acordo. Ultrapassei o Prost já quase na curva Tosa, quase no meio do circuito e num ponto sem o menor risco para nós dois. Pela interpretação dele, eu teria que ficar atrás até o fim da corrida, teria explicado Ayrton Senna, de acordo com essa testemunha.

SILÊNCIO

Oficialmente, nem os pilotos nem a equipe comentaram o entrevero. Senna apenas relembrou o momento decisivo.

Eu e o Prost tínhamos carros iguais, motores iguais, mas o acerto era diferente. Por isso, ele era mais rápido do que eu em algumas partes do circuito, enquanto em outras eu era mais veloz. Na segunda largada, o Alain saiu melhor, mas peguei logo um vácuo muito grande e, ali na frente, já consegui ultrapassar.

O brasileiro também elogiou o carro, projetando novas melhoras. Todas as outras equipes têm como objetivo chegar onde estamos, e de nossa parte, tanto a McLaren como a Honda se empenham, com trabalho e pesquisa, para manter a liderança. Vamos ter agora mais quatro dias de testes na Inglaterra. Em que esse carro pode melhorar? Em várias coisas no chassis. O carro é ótimo, mas ainda não está 100%, tem potencial para melhorar.

ESCLARECIMENTOS

A queda de braço entre os pilotos só seria abordada em público pela McLaren antes do GP de Mônaco. Ron Dennis convocou uma coletiva para tentar impedir que a bola de neve crescesse ainda mais. Nas duas semanas que separaram as duas provas, o clima pouco amistoso não se dissipou.

Nunca houve, nem nunca haverá, ordens da equipe para privilegiar este ou aquele piloto. O que aconteceu em Imola foi que Prost e Senna fizeram seus próprios acordos, por questões de segurança, estabelecendo que quem fizesse a melhor largada deveria tomar a primeira curva sem ser atacado, explicou o chefão. No futuro, eu tomarei parte de qualquer acordo que os pilotos venham a fazer. Nós continuaremos a dar oportunidades iguais e o mesmo equipamento aos dois pilotos. Nossa intenção é sempre vencer, mas queremos que haja graça e prazer na nossa equipe.

Ayrton Senna deu sua versão. Acordos entre nós aconteceram várias vezes no ano passado, sem problemas. O que houve desta vez foi uma má interpretação, da minha parte e da parte dele, sobre o que foi tratado. O brasileiro deixou no ar a possibilidade de novos acordos, sem esclarecer se seu relacionamento com Prost havia sofrido uma série ruptura. Não falamos mais sobre isso. Tudo depende de cada corrida. Depois, a gente está aqui para correr. Se tiver muito acordo, perde a graça.

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